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Brasil: o gigante adormecido despertou?

Braga - Concelho mais Liberal de Portugal

Ideias

2014-09-20 às 06h00

António Ferraz António Ferraz

Vivendo no Rio de Janeiro nos anos 1950 e 1960 sempre ouvi dizer que o Brasil era como que um eterno “gigante adormecido”. Poderemos dizer que agora a antiga colónia portuguesa despertou finalmente? Iremos opinar então sobre a realidade atual da economia e sociedade brasileiras. Em texto futuro abordaremos a questão de como Portugal, uma pequena economia aberta, poderá beneficiar e muito se expandir as suas relações económicas e comerciais com este País de dimensões continentais e com um enorme mercado interno.

Nas últimas décadas, o Brasil conseguiu obter estabilidade e crescimento económicos que tanto lhe tem faltado no passado e que tem sido transversais a várias governações:

(1) Fernando Cardoso (FHC): instituiu a nova moeda brasileira com o Plano Real e adotou o regime de câmbios flutuantes; estabeleceu a regra da responsabilidade fiscal/disciplina orçamental aos níveis federal, estadual e municipal; definiu uma meta da inflação de 4,5% ao ano (com um desvio máximo tolerado de 2%). Encetou algumas privatizações, com destaque para a Companhia do Vale no sector dos minérios. Afastou, assim, o histórico de estagnação e alta inflação no país.

(2) Lula da Silva (Lula): manteve, no essencial, as políticas macroeconómicas de FHC; prosseguiu uma política de melhorias salariais; avançou com um ambicioso plano de redistribuição do rendimento e inclusão social, nomeadamente o chamado “Bolsa Família” (atribuído às famílias mais carentes) e, assim, viabilizou a saída de milhões de brasileiros em situação de miséria gerando uma nova classe média no país; estimulou a concessão de crédito bancário às famílias e empresa o que fez alavancar o consumo interno, tornando-o motor principal do crescimento económico; iniciou o processo de pesquisa e exploração de petróleo no pré-sal brasileiro (no alto mar e a grandes profundidades); assistiu-se a valorização da moeda real o que contribuiu decisivamente para o controle dos preços (ao embaratecer as importações).

(3) Dilma Rousseff (Dilma): a atual presidente do Brasil prosseguiu, em geral, as políticas económicas e sociais de Lula; programou políticas de desenvolvimento económico e social procurando associar crescimento económico e justiça social, tendo para tal definido objetivos centrais: melhoria na produtividade económica e maior eficácia na prestação de serviços públicos, mormente nas áreas da educação, saúde, justiça (combate à morosidade, corrupção e burocracia) e infraestrutura (estradas, portos, aeroportos, transportes, etc.); prosseguiu o processo de exploração petrolífera no pré-sal brasileiro.

Nos últimos anos, porém, Dilma tem vindo a se confrontar com alguns sinais económicos e sociais preocupantes, como o abrandamento do crescimento económico (1% e 2,3%, em 2012 e 2013, respectivamente, valores muito longe dos alcançados em anos anteriores). Esta pioria no cenário macroeconómico brasileiro pode ser explicada:
(1) por motivos externos, com os efeitos adversos a economia brasileira, sobretudo quanto a diminuição das exportações e saída de capitais fruto, em grande parte, da crise económica e financeira global iniciada em 2007/2008, e
(2) por motivos internos, com a subida da inflação devido, por um lado, às medidas expansionistas entretanto tomadas por Dilma visando blindar a economia brasileira do choque negativo global promovendo, assim, a descida da taxa de juro e o aumento dos gastos públicos, e, por outro, às alterações nos mercados cambiais com uma desvalorização excessiva da moeda real. Face a esta nova situação, Dilma passou a priorizar o combate à inflação tomando medidas de política opostas as inicialmente adotadas, tais como, a subida da taxa de juro, restrição ao crediário bancário e intervenção do Banco Central Brasileiro (BCB) nos mercados cambiais tentando estabilizar o valor da moeda real.

Em suma, este gigante adormecido chamado Brasil parece ter despertado de seu longo adormecimento, mas há fragilidades e ainda muito a fazer para a consolidação dos progressos alcançados pela economia e sociedade brasileiras.

Assim, o crescimento económico do Brasil tem vindo a assentar principalmente nos seus abundantes recursos naturais, no seu estado social em formação e, mais importante, no facto de ter uma população muito jovem. Persistem, porém, como referimos, muitas fragilidades que tem vindo a impedir o Brasil de alcançar um índice de desenvolvimento humano (IDH-ONU) mais adequado à sua grandeza. A resolução dessas carências deverá ser vital nas futuras governações brasileiras, em particular, as reduções das ainda elevadas assimetrias regionais e sociais.
Concluiremos traçando de forma resumida as principais forças e fraquezas da economia e sociedade brasileiras:

Pontos fortes:
(1) Após décadas de estagnação e alta inflação, o Brasil é agora um país de crescimento (o crescimento do PIB, em média, foi próximo dos 4% na última década); com uma inflação ainda relativamente controlada (5,8% em 2012; 6,2% em 2013);
(2) Obteve francos progressos no combate à pobreza e desigualdade social;
(3) Possui um mercado interno enorme e dinâmico;
(4) A evolução favorável na balança das exportações de matérias-primas e petróleo (recursos naturais em bruto), bem como, a tendência para a subida dos seus preços mundiais (em grande parte consequência da elevada procura das mesmas pela China);
(5) A valorização inicial do real embora trazendo perdas de competitividade externa a curto prazo, obrigou de forma positiva a que muitas empresas tivessem de inovar e elevar os seus níveis de eficiência e produtividade.

Fragilidades:
(1) A crise global tem vindo recentemente criar dificuldades à economia brasileira (menos exportações e mais saídas de capitais);
(2) Nos últimos anos apesar dos preços das matérias-primas continuarem elevados já não se registaram, contudo, subidas no valor das exportações, o que por si só, permitiria puxar novamente o crescimento económico do país;
(3) A moeda real ainda apresenta uma volatilidade indesejada;
(4) A elevada concentração das exportações brasileiras em matérias-primas (em detrimento dos produtos industriais) torna a economia brasileira mais vulnerável às crises mundiais.

Potencialidades e Riscos:
(1) Ao invés das décadas anteriores, onde as exportações de matérias-primas e a política de redistribuição do rendimento explicavam o elevado crescimento económico, agora, esgotado que o modelo, o Brasil, para crescer de forma sustentada tem de prosseguir reformas estruturais fundamentais, como sejam: melhoria da produtividade interna e da competitividade externa; eliminar o excesso de protecionismo; reforçar o combate à corrupção e à burocracia; mais eficiência na prestação de serviços públicos, nomeadamente nas áreas da educação, saúde, justiça e infraestrutura;
(2) Sendo um país jovem e com um estado social emergente urge criar condições para o financiamento do sistema de segurança social;
(3) A diversificação das exportações é crucial;
(4) No sector agrícola, o Brasil possui uma estrutura tecnologicamente avançada, mas abrange apenas uma parte do território, sendo importante dar-lhe uma maior extensão.

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